Elaboração do luto é a readaptação à realidade sem a pessoa que faleceu. Quando perdemos alguém que amamos, fica o vazio, temos que abrir mão dos planos, sonhos, expectativas, rotina e recomeçar, ressignificar. O processo de elaboração do luto acontece de forma gradual, nem todas as pessoas passam por fases que se sucedem umas às outras, o luto exige um tempo, que é pessoal, para ser elaborado.
No luto ao perceber que a pessoa não existe mais, o enlutado inicia um processo de desligamento que causa muita dor e sofrimento, pois há resistência em romper os laços com aquele que se foi. Toda energia da pessoa que fica se volta para essa dor, havendo uma perda de interesse pelo mundo externo e pelas atividades que antes realizava.
Externalizar esses sentimentos favorece o processo de reestabelecimento, ao contrário do que se acredita socialmente, reprimir os sentimentos é prejudicial e dificulta todo processo. A família enlutada precisa ser acolhida em sua dor.
Leva-se tempo para que a pessoa consiga perceber e aceitar a mudança em si mesma a partir de uma perda. Esse tempo é importante para que as mudanças e reorganização interna aconteçam, o equilíbrio abalado seja retomado e possibilite então, o investimento emocional em outras atividades, pessoas.
A elaboração do luto não termina a relação com aquele que se foi, mas estabelece um novo tipo de vínculo. A dor e o sofrimento dão lugar ao amor, às lembranças e toda transformação e alegria que a sua presença trouxe.
Não significa deixar de amar, mas colocar o amor em outro lugar no coração da família e seguir, reajustando-se ao ambiente com a ausência da pessoa que se foi.
Sabe daquelas coisas que você nunca imagina e que aparecem na sua vida? Então, nunca imaginei trabalhar com luto, embora exista situações na minha família que merecem cuidado, eu não pensava em me dedicar a estudar e trabalhar com luto.
Mas no meu estágio, a minha primeira paciente era uma mãe que tinha perdido a filha em um afogamento. Toda dor e vivência dela me mobilizaram. E sem esperar ou buscar, chegou a mim outra mãe que havia perdido o filho em um acidente de carro. Eu não acredito em coincidências, mas que tudo tem uma razão de acontecer, nada é por acaso e as minhas escolhas e percepções que me levarão pelo caminho certo ou não. E nesse caso, eu não poderia deixar passar em vão. Então, foi aí que comecei a estudar e me dedicar a entender o luto, principalmente o luto pela perda de um(a) filho(a). E meu trabalho de conclusão de curso, não poderia ter outro tema senão: Fenomenologia da vivência do luto pela figura materna.
De lá pra cá, foram alguns anos, experiências, transformações que me fizeram afastar e mais tarde voltar a trabalhar com o luto. Agora com outro olhar, mais experiente, mais maduro, mais empático.
Quando evito memórias por medo da dor...
É comum ouvirmos de pais de anjos que preferem não falar na perda, que evitam lembranças, conversar e até mesmo a terapia por medo de sofrer, medo de sentir tamanha dor novamente principalmente quando estão em um momento mais tranquilo.
Mas não temos uma boa notícia nesse sentido, a dor sempre volta. Costumamos dizer que o luto é como o mar, algumas vezes é calmaria, outras, mar revolto. É um movimento muitas vezes em cadência de calmaria, muitas em tormentas que tiram o chão. Mas a boa notícia é que ao longo das marés, o que muda é a maneira como você lida com a dor. À medida que você se permite entrar em contato com ela, e aceita-la como parte de sua história, ela vai deixando de ser ameaça, para se tornar apreciável, assim como o mar. E você vai entender que ela sempre estará ali, e que esse movimento de ondas de alegria, calmaria, dor, saudade sempre vai existir. E o amor, sempre estará aí. E é ele que vai sempre prevalecer.
Quando se perde um filho ainda na barriga ou vai passar por um parto de um bebê com síndrome grave, com prognóstico de pouco tempo de vida fora do útero, a dor é imensurável, e passar por tudo isso sem apoio emocional e assistência psicológica é ainda mais difícil.
A assistência psicológica no parto abrange o apoio emocional, físico e o cuidado com o psíquico.
Durante o parto (normal ou cesárea) podem surgir medos, falas internas de incapacidade, culpas ou mesmo dificuldades inconscientes de se despedir do bebê que podem influenciar no seu decorrer.
Nosso papel é estar ali ao lado dessa mulher, para acolhê-la em sua dor, física e emocional. Ajudá-la a assimilar o que está acontecendo, aceitar a partida do filho e permitir que ele vá. Isso é fundamental para o sucesso da indução de parto e para o trabalho de parto e parto, além da cesariana.
Essa permissão para partir, essa despedida, precisa ser iniciada ali para a família que teve a notícia do óbito inesperadamente, pois as famílias que levaram uma gestação com diagnóstico de síndrome grave começam essa despedida desde o momento que conseguem assimilar o que está acontecendo, principalmente se têm acompanhamento psicológico.
Viver esse processo com consciência e apoio favorece uma experiência amorosa que vai reverberar no luto da família.
Vamos ajudá-la a dar sentido à experiência única que ela está vivendo.
O parto é um fator de risco imenso para o adoecimento psíquico se não é vivido de forma saudável, e tem muito mais risco psíquico quando em situações de perdas e despedidas. Portanto a assistência psicológica também é preventiva. Protegendo a subjetividade, promovendo saúde emocional, mental, psíquica e até física. Apoiando a mulher e a família para que o processo de luto seja vivenciado de forma saudável, embora extremamente dolorosa.